
a asa é uma grande mão deformada, com os dedos pendentes, uma mão partida e inerte.
anjos plenos da intenção de voo, corpos de cor que erguem com eles a tela. parecem sempre prontos a sair. e depois vêem as palavras como machetes, cutelos, foices, que lhes quebram o desejo. e ficam anjos feridos. tal como perdizes, com um chumbo na asa, arrastam-se aos tropeços, tentando o equilíbrio e recaindo na ferida.
os anjos vieram morrer todos a esta casa, mas não os anjos alemães, que eram louros, altos e fodiam uns com os outros a limpa foda ariana. uma madrugada, desceu para eles outro anjo mais implacável, levou-os nus para o jardim e metralhou-os contra um fundo plácido de montanhas: o eco dos tiros devolvia ao amanhecer o silêncio pastoril.
rui nunes.